Pesquisadores criam ligas metálicas que absorvem hidrogênio de forma segura
Objeto feito de magnésio, com estrutura em escala nanométrica, oferece maior resistência à corrosão e ao desgaste do que os metais convencionais
09 de maio de 2012 | 12h 54
Agência Fapesp
Uma
liga de magnésio com estrutura em escala nanométrica (da bilionésima
parte do metro) capaz de absorver e aprisionar hidrogênio de forma
segura, liberando-o somente quando aquecida. E uma liga metálica que
possui maior resistência à corrosão e ao desgaste do que os metais
convencionais.
Divulgação
O metal se torna frágil, mas ao mesmo tempo passa a ter uma resistência extremamente elevada
Possibilidades de desenvolvimento dessa nova classe de ligas metálicas, que englobam as ligas amorfas, metaestáveis e nanoestruturadas, foram apresentadas na First São Carlos School of Advanced Studies in Materials Science and Engineering (SanCAS-MSE) - Primeira Escola São Carlos de Estudos Avançados em Engenharia e Ciências dos Materiais, realizada entre os dias 25 e 31 de março.
Realizado no âmbito da Escola São Paulo de Ciência Avançada (ESPCA), modalidade de apoio da FAPESP, o evento foi organizado pelo Departamento de Engenharia e Ciências dos Materiais (DEMa) da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), sob a coordenação dos professores Edgar Zanotto, Elias Hage Junior e Walter José Botta Filho.
Por meio de um Projeto Temático, realizado com apoio da FAPESP, os pesquisadores do DEMa começaram a desenvolver e a caracterizar nos últimos anos ligas metálicas com melhores propriedades mecânicas do que os metais convencionais, conferidas pelo processo de resfriamento a que são submetidas.
Ao serem resfriadas rapidamente em sua fase líquida, na faixa de 1 milhão de graus por segundo, os átomos que compõem a estrutura dessas ligas não têm tempo de se rearranjar de maneira ordenada e formar uma estrutura cristalina de pequenos aglomerados de átomos, como a dos metais convencionais. Em função disso, em estado sólido essas novas ligas retêm a mesma estrutura desordenada dos átomos em estado líquido (amorfo).
Por terem sido resfriadas rapidamente, as ligas metálicas amorfas também permanecem em uma condição de metaestabilidade - em que não estão na condição energética mais estável para elas.
Dessa forma, além de apresentar uma série de propriedades diferenciadas dos materiais convencionais, como maior resistência, quando voltam à sua condição de equilíbrio também podem resultar em novas microestruturas, formando, por exemplo, grãos cristalinos na escala nanométrica.
“Essa condição amorfa confere propriedades muito interessantes ao metal, que são muito próximas às de um vidro. Ele se torna frágil, mas ao mesmo tempo também passa a ter uma resistência extremamente elevada”, disse Botta Filho, coordenador do projeto, à Agência FAPESP.
De acordo com ele, uma das aplicações dessas novas ligas metálicas nanoestruturadas é na armazenagem sólida de hidrogênio. Os pesquisadores estão desenvolvendo no âmbito do projeto protótipos de tanques de armazenagem de hidrogênio, compostos por ligas de magnésio nanoestruturadas, que são capazes de aprisionar o gás de forma segura para ser posteriormente utilizado para geração de energia.
Ao ser injetado no tanque de armazenagem, o hidrogênio reage com o magnésio das ligas que compõem o compartimento e forma um hidreto metálico que se decompõe quando aquecido a uma determinada temperatura, liberando o gás para ser queimado, por exemplo, em um motor a combustão ou em uma célula a combustível para geração de energia.
“Essa é uma alternativa muito interessante de armazenar hidrogênio que pode ser utilizada para substituir os cilindros de alta pressão utilizados para aprisionar o gás, que são extremamente pesados”, disse Botta Filho.
Ligas amorfas
Outra aplicação das ligas metálicas desenvolvidas e caracterizadas pelos pesquisadores está no recobrimento de tubos para extração de óleo e gás utilizados pelas indústrias petrolíferas, que costumam apresentar problemas de corrosão e se degradam com o tempo.
“Na tentativa de solucionar o problema, vários tipos de recobrimentos têm sido utilizados. Somente nos últimos anos, porém, as ligas de metais amorfas, que apresentam excelentes propriedades de resistência à corrosão e ao desgaste, têm sido avaliadas para essa finalidade”, disse Botta Filho.
“Desenvolvemos ligas metálicas amorfas que apresentam maior resistência à corrosão e ao desgaste e agora estamos aplicando-as em superfícies de metais tipicamente utilizados em tubulações”, disse.
O grupo também estuda a utilização de ligas metálicas para o desenvolvimento de implantes biomédicos biodegradáveis. Feitas de elementos como cálcio, magnésio e zinco, as ligas metálicas podem ser utilizadas na fabricação de parafusos para ossos, por exemplo, que após um determinado tempo são absorvidos pelo organismo.
“Ligas metálicas para essa finalidade estão sendo testadas em animais por cientistas na Suíça, e o desempenho tem sido muito bom”, disse o pesquisador.
Outras ligas metálicas também desenvolvidas pelos pesquisadores poderão ser utilizadas em pinos de implantes dentários. Feitas de titânio nanoestruturado, as novas ligas permitem diminuir muito a espessura dos pinos convencionais, mantendo a mesma resistência mecânica. Por conta disso, invadem menos o organismo do paciente.
“Esse tipo de pino de titânio nanoestruturado já está em fase de aprovação no FDA (a agência regulamentadora de alimentos e fármacos dos Estados Unidos)”, disse Botta Filho.
Durante a Primeira Escola São Carlos de Estudos Avançados em Engenharia e Ciências dos Materiais, os pesquisadores da UFSCar deram aulas práticas aos estudantes de pós-graduação brasileiros e estrangeiros participantes sobre como desenvolvem e caracterizam metais amorfos, metaestáveis e nanoestruturados, utilizando os equipamentos de que dispõem no DEMa.
As atividades complementaram as aulas teóricas proferidas por cientistas estrangeiros especialistas em processamento e propriedades de materiais metálicos avançados, como Gary Purdy, professor de engenharia e ciência dos materiais da McMaster University, do Canadá, Lindsay Greer, professor de ciência dos materiais da University of Cambridge, no Reino Unido, e Terence Langdon, professor da University of Southern California, nos Estados Unidos.